Durante Conferência Internacional sobre AVC, que aconteceu em fevereiro, no Phoenix, Arizona (EUA) e considerado um dos eventos mais importantes relacionado às doenças cerebrovasculares, foram apresentados os resultados de um Ensaio Clínico Controlado Randomizado (RCT) patrocinado pelo Ministério da Saúde, os quais constataram que a trombectomia mecânica (TM) é mais eficaz do que a terapia médica isolada para tratar Acidente Vascular Cerebral isquêmico em hospitais com recursos limitados e com pouco ou nenhum acesso à ressonância magnética ou outro tipo de neuroimagem mais avançada.
A maioria dos estudos relacionados ao procedimento havia sido realizado em países desenvolvidos utilizando avaliação por ressonância magnética ou tomografia com perfusão, exames pouco disponíveis no sistema público de saúde brasileiro ou em outros países menos desenvolvimentos. A presidente da Rede Brasil AVC e da World Stroke Organization (Organização Mundial de AVC), Sheila Ouriques Martins, e o médico neurointervencionista Raul Nogueira, professor de Neurologia e Neurocirurgia da Universidade de Pittsburgh (EUA), foram os pesquisadores à frente do estudo e ressaltam que há evidências contundentes do benefício da TM no tratamento de AVC com oclusão de grandes vasos até 24 horas após o episódio.
A trombectomia mecânica consiste na desobstrução da artéria cerebral realizada por um cateter que leva um dispositivo endovascular, um stent ou um sistema de aspiração, para remover o coágulo do vaso sanguíneo do cérebro. Pode ser realizada até 24h de início dos sintomas e aumenta em três vezes a chance de o paciente ser independente após o AVC, por diminuição das sequelas.
O AVC isquêmico é o tipo mais comum de AVC e corresponde a 80% e 85% dos casos. A cada minuto em que o AVC isquêmico não é tratado, a pessoa perde 1,9 milhão de neurônios, o que resulta em graves comprometimentos que podem deixar sequelas permanentes, como redução de movimentos, perda de memória e prejuízo à fala.
O estudo
O estudo apresentado na Conferência Internacional sobre AVC envolveu 245 pacientes randomizados entre 8h e 24 horas após o início dos sintomas do AVC, em 12 centros de saúde pública no Brasil com a coordenação do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e financiamento do Ministério da Saúde. As pessoas tinham cerca de 60 anos e pouco menos da metade eram mulheres. O estudo envolveu uma população diferente daquela incluída em outros ensaios clínicos de trombectomia que foram realizados principalmente em países do primeiro mundo.
O Resilient-Extend é o primeiro grande estudo sobre trombectomia no período tardio realizado fora dos países do primeiro mundo e mostra que o procedimento também traz benefícios em uma população de nível socioeconômico mais baixo, sem a necessidade de equipamentos de imagem mais caros, como ressonância magnética e perfusão por tomografia computadorizada.
“O Resilient-Extend mostrou benefício da trombectomia sem exames de imagem avançados, aumentando o acesso global ao tratamento. Então, demonstramos que a trombectomia mecânica pode ser estendida a 80% da população global em países de renda média e baixa que não têm acesso a imagens avançadas”, enfatiza Sheila. Fica a pergunta sobre o que fazer em relação aos pacientes com mais idade e mais vulneráveis atendidos no sistema público e que não apresentaram boa resposta ao tratamento”, acrescenta Raul.
Em novembro de 2023, o Ministério da Saúde incluiu a TM na Tabela de Procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS) e habilitou os primeiros 12 hospitais a utilizar este tratamento e a solicitação pelos gestores estaduais, distrital e municipais do SUS, para a habilitação de novas instituições.
Mortes no Brasil em 2024
Até 15 de março, segundo dados do Portal de Transparência da Associação de Registradores de Pessoas Naturais, o AVC já matou 19.505 pessoas no Brasil, número superior aos casos de infarto (17.831).
“A trombectomia mecânica reduz as taxas de mortalidade, o tempo de internação e dá mais chances para a boa recuperação no pós-AVC grave. É um procedimento seguro, eficaz, com o seu benefício demonstrado no SUS, e um grande avanço no tratamento dos pacientes de AVC isquêmico”, conclui Sheila.