Uma parceria inédita entre poder público e Complexo Pequeno Príncipe busca a solução para reduzir – ou até mesmo eliminar – os antibióticos de efluentes hospitalares. A resistência antimicrobiana é uma questão de saúde pública mundial. A Organização das Nações Unidas chama atenção para a exposição desavisada de pessoas à água contaminada com antibióticos, capaz de multiplicar patógenos resistentes a medicamentos. De acordo com relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), elaborado em 2022, em 87 países, mais de 50% das infecções bacterianas fatais estão tornando-se resistentes ao tratamento com antimicrobianos. Por isso, filtrar esses micropoluentes é fundamental.
O projeto pioneiro, oficializado na última terça-feira, dia 2, entre o Pequeno Príncipe e a Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), pretende antecipar-se ao problema ao pesquisar uma solução de tratamento que melhore a qualidade desses efluentes. Parte do esgoto produzido nos hospitais é composto por secreções dos pacientes internados que recebem uma grande concentração de medicamentos que depois são eliminados pelo organismo. Atualmente, não existe legislação específica no Brasil que disponha sobre o assunto, e a expectativa é a de que os resultados obtidos a partir da experiência paranaense sirvam de referência e estimulem outras iniciativas.
A proposta prevê a utilização de protótipos para tratamento e testagem dos resíduos. “No Brasil, poucas instituições pesquisam efluentes. Principalmente buscando soluções como o desenvolvimento e testagem de elementos filtrantes que possam reter micropoluentes, categoria dos antibióticos. Estamos confiantes nos resultados, que vão gerar conhecimento científico que ficará à disposição da sociedade e de outras empresas de saneamento do país”, ressalta o diretor-corporativo do Complexo Pequeno Príncipe, José Álvaro Carneiro.
Evidências científicas
A maneira mais eficaz de eliminar ou reduzir a concentração de medicamentos e evitar a proliferação das bactérias residentes é o tratamento do volume de efluentes gerado nos hospitais. O consumo de água mensal do Pequeno Príncipe, por exemplo, é de 6.200 metros cúbicos, produzindo no mesmo período, 3.350 metros cúbicos de efluentes hospitalares. Dados da instituição, apontam que cerca de 65% de seus pacientes recebem antibióticos durante o tratamento. São administrados mais de 90 tipos dessa medicação. É a presença desses antimicrobianos nos efluentes e no ambiente dos rios que favorece o desenvolvimento das superbactérias, grande preocupação da OMS e foco do projeto.
As atividades decorrentes da parceria são baseadas nas evidências científicas de trabalhos de mestrado e doutorado realizados pelo Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe. Os resultados forneceram um diagnóstico dos inúmeros resíduos medicamentosos gerados por hospitais, conforme explica a coordenadora da pesquisa, Líbera Maria Dalla Costa. “Hospitais em geral são locais de concentração elevada de medicamentos. Alguns deles passam pelo organismo humano quase que inalterados e vão direto para a estação de tratamento, onde não há capacidade de remoção pelo sistema convencional”, explica a pesquisadora com pós-doutorado na área de monitoramento da resistência a antibióticos, realizado no laboratório de saúde pública de Londres.
Bem público
Presente na cerimônia de assinatura do Acordo de Cooperação Técnica (ACT) o governador em exercício, Darci Piana, enfatizou o benefício da ação para a população. “São instituições de excelência que, juntas, promoverão um grande avanço para a sociedade. Os dois lados possuem pesquisadores de ponta para desenvolver tecnologia paranaense em prol da saúde pública do estado”, considerou.
O diretor-presidente da Sanepar, Wilson Bley Lipski, falou da preocupação global com o surgimento de superbactérias, que passa pelo controle dos efluentes hospitalares. Ele também destacou a intenção da empresa de aprimorar a qualidade e a eficiência nessa área. “Queremos que o conhecimento técnico seja aplicado em benefício da sociedade. Este será um projeto-piloto, mas neste encontro já abrimos a conversa para outras oportunidades”, avaliou.
Já o diretor de Inovação e Novos Negócios da Sanepar, Anatalício Risden, salientou a experiência da companhia. “A gente tem a prática para processar esse material de maneira a ter soluções, e é isso que vamos trabalhar em conjunto com o Pequeno Príncipe para constatar como podemos melhorar esse tratamento que a Sanepar faz. Nós temos que entregar uma água para consumo humano com condições plenas. O projeto-piloto deve alcançar o resultado nos dois próximos anos”, disse Risden.