A integração entre genética e estilo de vida tem ganhado destaque na medicina preventiva, oferecendo um novo nível de personalização para os cuidados com a saúde. Com o avanço das tecnologias de sequenciamento genético, informações antes restritas a ambientes médicos especializados agora estão acessíveis ao consumidor final, permitindo a interseção entre genética, nutrição, esportes e prevenção de doenças.
Apesar dos avanços, a aplicação desses testes na prática clínica ainda enfrenta desafios técnicos, financeiros e éticos, especialmente no Brasil, onde fatores como acessibilidade e diversidade genética influenciam diretamente na eficácia desses exames.
A ciência por trás dos testes genéticos
Estudos internacionais mostram que a combinação de dados genéticos e fatores de estilo de vida pode aumentar a precisão na previsão de riscos de doenças. Um estudo publicado na Nature Communications revelou que a utilização de escores de risco poligênico (PRS) ajuda a identificar indivíduos com alto risco de desenvolver câncer de mama, diabetes tipo 2 e hipertensão, possibilitando intervenções precoces e mais eficazes.
No entanto, a predisposição genética não é uma sentença absoluta. Um estudo do American Journal of Clinical Nutrition demonstrou que indivíduos com variantes genéticas associadas à obesidade podem mitigar esses efeitos por meio de intervenções nutricionais personalizadas e atividade física regular.
Já no Brasil, uma parceria entre a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e pesquisadores internacionais revelou que a testagem genética para mutações nos genes BRCA1 e BRCA2 pode prevenir milhares de casos de câncer de mama e ovário, além de gerar economia para o sistema de saúde.
Desafios da aplicação dos testes genéticos no Brasil
Embora promissores, os testes genéticos de estilo de vida ainda enfrentam barreiras significativas, entre elas:
1. Acessibilidade e infraestrutura
- O custo dos testes pode variar de centenas a milhares de reais, tornando-os inacessíveis para grande parte da população.
- A infraestrutura laboratorial ainda não está totalmente adaptada para oferecer análises genéticas de alta precisão de forma ampla.
2. Falta de representatividade genética
- A maioria dos bancos de dados usados para escores de risco genético são baseados em populações europeias e norte-americanas, o que pode comprometer a precisão dos testes em populações miscigenadas, como a brasileira.
- A Sociedade Brasileira de Genética Médica alerta que a variabilidade genética do país exige mais estudos locais para garantir a aplicabilidade clínica desses exames.
3. Interpretação dos resultados
- A análise dos dados genéticos requer profissionais capacitados, capazes de integrar essas informações ao histórico clínico e aos fatores ambientais de cada paciente.
- Uma interpretação superficial dos resultados pode levar a decisões inadequadas, como dietas e rotinas de exercícios baseadas exclusivamente na predisposição genética.
4. Questões éticas e segurança dos dados
- A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) regula o uso de dados pessoais no Brasil, mas o armazenamento e compartilhamento de informações genéticas ainda levantam preocupações.
- Há receios sobre o uso indevido dos dados por seguradoras e empresas farmacêuticas, o que poderia resultar em discriminação ou uso comercial indevido.
O crescimento do mercado de testes genéticos
O setor de testes genéticos está em plena expansão. Projeções indicam que o mercado global atingirá US$ 19,66 bilhões em 2024, com uma taxa de crescimento anual de 10,81%, podendo chegar a US$ 32,83 bilhões até 2029.
No Brasil, a adoção de testes genéticos personalizados cresce gradualmente, impulsionada pelo aumento da conscientização sobre saúde preventiva e bem-estar. No entanto, para que esses exames sejam integrados de forma eficiente na prática clínica, são necessários:
- Investimentos em infraestrutura e capacitação de profissionais.
- Maior regulamentação e certificação dos serviços laboratoriais.
- Aprimoramento dos bancos de dados genéticos para refletir a diversidade da população brasileira.
Além disso, um estudo do Journal of the American Medical Association (JAMA) revelou que há grande variação na precisão dos testes genéticos oferecidos por diferentes empresas, o que reforça a necessidade de mais rigor na regulamentação e certificação desses serviços.
Conclusão
Os testes genéticos de estilo de vida representam uma evolução promissora na medicina personalizada, permitindo intervenções mais precisas e eficazes. No entanto, sua implementação no Brasil exige cautela, considerando desafios técnicos, éticos e econômicos.
Para que essa tecnologia se torne acessível e confiável, é essencial que profissionais de saúde, pesquisadores e autoridades reguladoras trabalhem juntos para equilibrar inovação, segurança e aplicabilidade clínica.
A verdadeira revolução da genética na saúde não está apenas na previsão do risco de doenças, mas sim na capacidade de transformar essas informações em estratégias preventivas acessíveis e eficazes, garantindo que todos possam se beneficiar dessas descobertas de forma ética e segura.
Artigo de Rodrigo Matheucci, CEO do Grupo DNA.